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Caminho dos Anjos : Uma travessia pelas montanhas mágicas da Mantiqueira

  • 17/10/2019

São vários os motivos para se fazer o Caminho dos Anjos, atravessando as montanhas do sul de Minas Gerais. Para alguns, um desafio que rompe o limite do corpo e da mente, para outros, uma viagem e uma oportunidade de descobrir as riquezas naturais e culturais de cada lugar.


Texto e Fotos: Flavia Vilela

http://flaviavilela.46graus.com/blog/-

 

São vários os motivos para se fazer o Caminho dos Anjos, atravessando as montanhas do sul de Minas Gerais. Para alguns, um desafio que rompe o limite do corpo e da mente, para outros, uma viagem e uma oportunidade de descobrir as riquezas naturais e culturais de cada lugar.

Minas são muitas e, por esse caminho, nos encontramos com a vastidão das Gerais. Guimarães Rosa disse que “O Sertão vive dentro da gente”, por aqui, é a montanha que nos toma e passamos a fazer parte dela, assim como os moradores da região. É difícil separar os nativos da natureza que o circunda. O tempo e os costumes são outros. E para vivenciar isso, é preciso deixar a bagagem de lado e entrar de cabeça nas curvas, encruzilhadas e maravilhas que só quem está atento consegue ver.

Para quem percorre a pé são 10 dias de caminhada, 231 km de extensão, 7 cidades (Aiuruoca, Alagoa, Itamonte, Passa Quatro, São Lourenço, Caxambu e Baependi) - 4 das 5 que fazem parte do Parque Estadual do Papagaio. Há também as opções de bicicleta e de carro.

Nessas Gerais, a agua se mistura com a pedra; a estrada batida de terra com o trem de ferro; a fauna e a flora abundante e diversa, as cores, formas e sabores se misturam e se tornam uma coisa só. “Quer uma xícara de café?”; “Se achegue, venha ouvir um causo”; ”Tem medo de assombração?”; “Né longe não, é lá pros lados das terras dos mudos, uma légua e meia”, “ Já foi no santuário de Nhá Chica, é milagroso”. Se estiver com pressa, nem precisa começar. O tempo na montanha se sublima e uma manhã é pouco para um sertanejo arrastar um papo macio e contar de um tempo antigo, de quando ainda nem luz tinha.

E, ás vezes, a luz ainda não chegou. Mas pra quê? Uma conversa com os vizinhos em torno do fogão a lenha, comida farta na mesa e uma cachaça do lado faz a novela não fazer falta. Uma noite no alto da Serra esvazia a cabeça e preenche os sentidos. E ali mesmo, ouvindo o barulho do vento e vendo as estrelas caírem por detrás das montanhas, pode-se fazer uma prece. Nessa montanhas, chamadas de mágicas, o catolicismo e o misticismo andam juntos em qualquer noite enluarada .

O viajante pode escolher o início e o fim do seu percurso, não precisa se preocupar em se perder ou fazer o caminho certo. E sempre haverá uma porta aberta e um papo em qualquer curva na estrada. E, por muitas vezes, são essas curvas que apontam a verdadeira direção.

“Digo, o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente é no meio da travessia” – Guimarães Rosa

 

Aiuruoca – MG

Depois de percorrer alguns quilômetros, avistei uma água cristalina, no meio da montanha, bem no alto da Serra. “Milagres existem, se você acredita neles”, disse Sr. Zé, sentando na pedra mais alta da cachoeira dos Garcias, no município de Aiuruoca. Ele disse que se subisse mais um pouco encontraria um pouso de peregrino, que se chama “Casa Verde” e que lá também servia almoço.

A cachoeira é o quintal desse pouso , fui recebida por um casal jovem, Juninho e Renilda. “Tá pensando em comer o quê, vamos alí na horta pra você escolher”. A horta orgânica do casal é inacreditável. Eles vivem no alto da Serra ,com poucos vizinhos ao redor. E foi assim que percebi que estava ao lado dos guardiões daquela mata. Eles e mais um casal que vive ali perto, Dadá e Aninha. Dadá é guia da região e faz passeios a cavalo, Aninha serve almoço no Recanto das Bromélias, um lugar mágico, com uma vista incrível. A vontade que dá é parar por ali e passar os dias com aquelas pessoas, mas o caminho ainda é longo. Me lembrei na hora do Toninho Horta que diz “ Como diz a história, aquele que tem um barco pronto pra zarpar tem que saber partir.”

Descendo a Serra, parei em uma bica para me abastecer de água. E foi de lá que avistei D. Mariana, a curiosidade me fez espichar o pescoço e chegar cada vez mais perto, foi quando ela sorriu pra mim. “Não repara nos meus trajes não, tô arrumando o gado, não tem muito jeito de não se sujar, por isso mesmo que nem te convido pra uma xícara de café, mas vai ter uma festa aqui, nesse fim de semana, ai você vem, né”. Com um sorriso no rosto e as mãos na enxada, disse ter fé nos anjos, na santa que a acompanha e faz seu ano se basear no calendário das festas religiosas. Nesse caminho, muitas vezes, o destino se coloca pra você.

 

Alagoa – MG

Depois de Aiuruoca, Alagoa. A intenção era passar por uma comunidade quilombola, mas o vento soprou em outra direção.

Pedir informação em Minas é sempre um caso a parte. O importante por aqui não é o destino, mas o caminho. E nesse caminho, encontrei com Seu Antônio, um homem do campo, que vive na estrada da Guapiara faz 15 anos. “ Sou daqui não, sou de Serranos. Tava casado há anos com uma mulher. Se separamo, ela ficou com a minha casa e eu com a dela. Mas tá bom, nem sei se quero voltar”. E de novo me lembrei do Horta: “ Mistérios são normais. Veja você, a gente sente sem pensar. E sem notar, vê que é feliz”.

Dizem que assim como a França tem todas as paisagens da Europa, Minas tem quase todas as paisagens do Brasil, exceto o mar (ainda). Só que a diferença é que lá existem catedrais e, em Minas, Igrejinhas. Pois foi justamente numa Igrejinha que fui parar. Uma igrejinha que virou santuário, em Alagoa, pelos milagres que concedia. A Igreja não, mas a sua santa: Nhá Chica.

A Igreja foi construída, primeiro nos sonhos de um homem, que recebeu uma graça, que ninguém sabe direito o que é, pois como disse o Gil: “Mistérios sempre hão de pintar por ai”, para só depois ser construída de fato. Em frente à Igreja, uma praça, e em frente à praça, uma casa. “Nossa casa foi construída na mesma época que a Igreja, nasceu junto com ela”. Disse Seu João, embora sua esposa dissesse que eles nem eram casados na época da construção da Igreja e que a casa deles tinha sido construída só anos depois de casados. Ele parecia nem ouvir a mulher, olhava para a Igreja e dizia que ali já tinha se visto muitos milagres, ele mesmo, tinha recebido uma graça com o filho mais novo. A fé, por aqui, chega a ser mais importante que o ouro, tão explorado na região na época dos desbravamentos e que ainda se pode ver os vestígios deixados pelo tempo.

 

Itamonte

Um caminho e vários encantos. São as estradas que levam pra frente carregando a tradição. Percorrer essa rota é se surpreender todo o tempo com as belezas naturais que guardam as Serras e, a sensação é de estar entrando em trilhas do passado numa viagem quase real, revivendo a história.

Martin Afonso de Souza, um colonizador, em meados do século XVI, ordenou aos seus homens que explorassem o interior do país. Ao atravessarem florestas virgens e transporem a Serra do Mar e da Mantiqueira, se depararam com um monte, um Pico, que desde então é referência na região. Esse povoado começou a se chamar de “Picu”, até sua emancipação. Depois disso passou a se chamar “Itamonte”, que significa Pedra do Monte ou Montanha de Pedra.

Aqui se fala muito da rota do Ouro, das visitas da Princesa Izabel, dos bandeirantes, da Estrada Real. Um pouco de história viva recontada pelos habitantes da cidade e redondeza. Foi assim que fui apresentada a Marcos Tridon, Diretor do Consórcio de Ecodesenvolvimento Regional da Serra do Papagaio. Como todo bom mineiro, me recebeu com um sorriso no rosto e uma proza boa. Me contou sobre a agricultura orgânica da região, a capacitação dos produtores rurais para essa prática e sobre os templos budistas que foram construídos por ali. E mais uma vez, a vontade de era de ficar mais uns dias e conhecer toda aquela realidade.

“Mas o viajante tem que saber partir”, lembrei outra vez do Horta e segui adiante.

 

Passa Quatro – Serra Fina

“A relação entre homens e a montanha inclui fatores míticos, poéticos e de desbravamento. O homem, ciente dos riscos, supera seus medos mais íntimos quando chega no cume ou atravessa uma montanha”, disse Paulo Marques, no começo de uma travessia de 4 dias pelas Serra Fina, em Passa Quatro. É considerada uma das travessias mais difíceis no Brasil, por alguns motivos: largura bem estreita, menos de 1 metro em alguns pontos da crista, poucos pontos de água no percurso, trechos com desníveis extremos, exigindo alto nível de resistência e esforço físico. Para isso, ele aconselha levar sempre o mínimo necessário e se preparar fisicamente e mentalmente. “Boa descida” foi o que ele disse quando nos despedimos e em poucas horas eu estava chegando no centro de Passa Quatro.

Uma cidade aconchegante, com seus casarios, ruas de paralelepípedo acompanhadas de belas praças. Para muitos que vem de São Paulo, Passa Quatro é o inicio do caminho. Além de muita história e tradição, existem vários pontos de água mineral que brotam pela cidade, alguns inclusive milagrosos, dizem os habitantes da cidade.

 

Circuito das aguas São - Lourenço e Caxambu

As propriedades terapêuticas e medicinais das águas dessa região são infindáveis. Os índios e os primeiros desbravadores de Minas descobriram que o líquido que nascia nas montanhas tinha algo além do sabor: era especial. Sua fama, entretanto, remonta principalmente ao século XIX, época em que a Família Imperial foi assídua frequentadora do local, em busca da magia e energia curadora da região. E foi assim que fui parar em São Lourenço e Caxambu, duas cidades que são famosas pelas suas águas e da necessidade de cuidar bem do corpo e, principalmente, da alma.

 

Baependi

Ar puro e fresco e uma paisagem quase bucólica marcam a cidade de Baependi e, mais uma, vez Nhá Chica e seus milagres. A cidade tem o santuário da santa e recebe devotos durante todo o ano, além de vários povoados e cachoeiras existentes no município.

“O peregrino descobre que ele deve carregar apenas o essencial na sua mochila, não precisa de supérfluos e, depois dessa travessia, ele transpõe o que aprendeu com a viagem para sua vida. Vai deixando o que não importa mais para trás”, disse Alexandre Maciel Gaspar, criador do Caminho dos Anjos. Alexandre criou o caminho dos Anjos depois de peregrinar diversas vezes por outros caminhos no mundo, como o de Santiago de Compostela. Disse ter recebido uma missão de criar no Brasil um caminho de auto-conhecimento. Estava com uma rota montada no Sul do País, quando chegou no sul de Minas Gerais e decidiu criar raízes.

“Depois de dias caminhando, o peregrino começa a questionar o seu sistema de valores, o sentido da sua vida, as coisas que importam. É uma viagem interior”, disse Madalena Matoso, esposa de Alexandre e colaboradora do Caminhos dos Anjos. O circuito engloba uma região envolta de misticismo, atmosfera que se faz a partir de histórias, mitos e lendas sobre o lugar. E, além disso, é um paraíso cercado por montanhas e águas cristalinas que deslizam pelas encostas de imensos vales.

São as descobertas ao longo do percurso que motivam os peregrinos a se aventurarem por trilhas, conhecer outras culturas, outros costumes e, principalmente, o interior que se carrega. Para isso, é preciso ter respeito com os limites do corpo e da mente. Uma das relações mais fortes nessa estrada é o enfretamento de nossas faculdades e energias mais primitivas e, para isso, não existe uma meta mais fascinante que esta: Um Homem e uma Montanha.

 


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